Território da arte. Este é o tema central da 8ª Bienal do Mercosul. Sob o título Ensaios de Geopoética, o evento busca discutir as relações entre arte e as questões de país e nação, identidade, território, mapa e fronteira.Em um mundo que passa por mudanças tecnológicas constantes que alteram o modo como pensamos, agimos e nos entendemos, a arte busca esclarecer e compreender a sua participação nesse processo, englobando aspectos geográficos, políticos, econômicos e culturais.
Dentro da sua programação, a Bienal desenvolveu sete ações (ou projetos). Santa Maria participa de dois deles: o projeto Continentes que divide com Caxias do Sul e Porto Alegre; e o projeto Cadernos de Viagem, que contará, também, com a participação de Santana do Livramento, Ijuí, Caxias do Sul, Ilópolis, Montenegro, Teutônia, Pelotas, Bagé, São Miguel das Missões, Tavares, Upamaroti, Porto Lucena e Pinhal da Serra.
A Sala Dobradiça participará do projeto Continentes, que tem como intenção promover a criação de redes de intercâmbio, trocas de conhecimento e colaboração entre organizações culturais independentes do Rio Grande do Sul e de outros países da América Latina. Por aqui passarão trabalhos de grupos de artistas do Paraguai, Planta Alta e dois projetos cubanos, Batiscafo e Proyecto Circo, entre setembro e outubro.
Em visita a Santa Maria em novembro do ano passado, o curador geral da Bienal, José Roca, e a curadora-assistente Germana Konrath conheceram um pouco do trabalho do grupo Sala Dobradiça. Foi no Espaço Suporte, sala anexa ao bar Macondo Lugar, que os visitantes foram apresentados ao trabalho que o Macondo Coletivo realiza nas suas diversas frentes de atuação (teatro, cineclubismo e audiovisual, artes visuais, música e comunicação). Também foram apresentados alguns dos trabalhos realizados no espaço suporte e trabalhos do próprio grupo Sala Dobradiça.
Em relato posterior, no blog da Bienal, Roca sintetiza sua impressão sobre o local e a proposta de trabalho do grupo santa-mariense: “Sala Dobradiça é um exemplo de que para ter uma programação de qualidade não é necessário um bom espaço, simplesmente um bom critério. O problema não é de metros quadrados nem de cubos brancos. De fato, a sala em si é um quarto minúsculo, com uma porta e uma janela, mas esta circunstância é aproveitada pelo coletivo para realizar exposições e intervenções onde – por força – a atenção é concentrada em um espaço e um conteúdo muito preciosos”. *tradução nossa
A sensibilidade das impressões do curador da Bienal traduzem de forma muito feliz as intenções do grupo Sala Dobradiça. Inicialmente, o espaço foi pensado para exposições que valorizassem a produção artística independente, trabalhando o próprio espaço físico como possibilidade de intervenção e fundamentação poética. Algo como o artista interferir no local a ponto de ele se tornar o próprio objeto artístico.
É com este conceito multidisciplinar e flexível que os coletivos artísticos convidados irão conviver. A diferença, no entanto, é que eles terão um espaço novo e inédito para expor seus trabalhos e, a partir dali, criarem novas obras. O grupo Sala Dobradiça propõe um espaço expositivo móvel, chamado Espaço Recombinante. “Inicialmente pensamos em trabalhar – e nomear – o espaço de nômade, porém o conceito de nômade implica em, quando ele abandona um lugar, não deixar nada para trás, e não era isso que queríamos. Queremos um espaço de diálogo com o local onde ele for montado e que deixe marcas lá”, explica Elias Maroso, um dos integrantes do grupo.
O Espaço Recombinante será uma estrutura de ferro, madeira compensada e lona. Cru e estrutural por fora, o seu interior, tal qual no espaço suporte Sala Dobradiça, é o artista e sua arte que tomarão conta. O fato de ser desmontável permitirá que ele circule por diversas regiões da cidade. Com isso espera-se aproximar e difundir a arte.
O conceito recombinante vem sendo trabalhando por muitos artistas e pensadores. Para o arquiteto Willian John Mitchell, espaços recombinantes são locais que atendem a demandas específicas da sociedade contemporânea, extremamente dependente das Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC). Esses espaços atenderam, inicialmente, a demandas arquitetônicas. Um exemplo ancestral seria uma cabine telefônica; mais recentemente, pode-se citar os espaços criados para abrigar os caixas eletrônicos de bancos.
Na arte existem exemplos na obra de artistas como Lars Spuybroek. A obra D-tower, criada em 1998, projetava luzes que buscavam demonstrar o “humor da cidade” a partir de perguntas respondidas por quem ia até o espaço. A Sala Dobradiça pretende praticar esse conceito tanto em sua dimensão literal – simples recombinar espaço-contextual – como também possíveis derivações/extensões em outras formas de espaço, como a web – afim de contemplar o que muitos pensam sobre o “recombinar urbano”, explica Elias.
A Bienal busca pôr em evidência e gerar discussão sobre esses espaços independentes e descentralizados. Sugere uma arte mais aberta ao público, desprendida de um espaço físico específico. Para além dos tradicionais – e muitas vezes elitistas – museus e galerias, ganha as ruas, gerando uma nova forma de compreender a produção artística e novas formas de fruição das obras.