Por Elias Maroso
Texto de original do artigo publicado hoje, na seção "Idéias" do Diário de Santa Maria -> LINK
Consideremos a possibilidade do espaço, da idéia de espaço e da sensação do espaço serem matérias de criação, como noções a serem dobradas, desdobradas e redobradas por um compromisso desafiador e de destino afinado pelas circunstâncias. Consideremos também que espaço só pode ser neutro em imaginários ascéticos, e que, mesmo não percebendo, nossas vidas por si só contaminam e fragilizam tal irrealidade, tão indiferente a sentidos, afetos e memória. Consideremos ainda a arte como um momento de encontro, quando nossos corpos se relacionam em variadas intensidades – e nós podemos, sim, articular de maneira própria tais relações.
Leia [+/-}
Em outubro, a rede de espaços independentes promovida pela 8ª Bienal do Mercosul ganhará novas tessituras com a vinda a Santa Maria das organizações culturais Batiscafo e Proyecto Circo, ambas de Havana, Cuba. Será um novo momento para afinarmos modos de produção artística, oriundos de localidades tão distantes entre si. Será, também, uma nova etapa de encontros, a itinerar por outros lados da cidade, em busca dos olhares e atitudes mais diversos.
Convidamos a todos para que façam parte desse novo processo. Que o realizemos juntos! O Espaço Recombinante sempre está à espera e permanece vivo enquanto se relaciona.
Texto de original do artigo publicado hoje, na seção "Idéias" do Diário de Santa Maria -> LINK
Consideremos a possibilidade do espaço, da idéia de espaço e da sensação do espaço serem matérias de criação, como noções a serem dobradas, desdobradas e redobradas por um compromisso desafiador e de destino afinado pelas circunstâncias. Consideremos também que espaço só pode ser neutro em imaginários ascéticos, e que, mesmo não percebendo, nossas vidas por si só contaminam e fragilizam tal irrealidade, tão indiferente a sentidos, afetos e memória. Consideremos ainda a arte como um momento de encontro, quando nossos corpos se relacionam em variadas intensidades – e nós podemos, sim, articular de maneira própria tais relações.
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Este texto é um convite a fazer parte e um breve relato sobre o projeto artístico-curatorial Espaço Recombinante, incluído na 8ª Bienal do Mercosul, em execução na cidade de Santa Maria através do grupo Sala Dobradiça e demais organizações culturais envolvidas. Com ele propomos um formato para exposições artísticas que dá prosseguimento à nossa intenção de flexionar/criar lugares e modos possíveis para a produção em arte visual e sua experiência comum. A proposta, um recente experimento, já indica formas e estratégias de como podemos elaborar e reelaborar a arte em relação ao contexto onde ela se insere.
Há dez dias foi inaugurada a estrutura física desse projeto, instalada nas ruínas de um incêndio na Gare da Estação Férrea, uma localidade já articulada por diferentes grupos e eventos culturais da cidade. Após desgastantes malabarismos orçamentários e burocráticos - muitas vezes na corda bamba – a idéia foi apresentada em sua forma primeira – em matriz básica, com materiais de baixo custo e tímidas dimensões. Durante os meses de setembro e outubro tatearemos alguma repercussão, com exposições de artistas residentes do Paraguai e Cuba, convidados da 8ª Bienal do Mercosul para estabelecer vínculos com a Sala Dobradiça e demais espaços de arte independentes, incluídos no projeto curatorial “Continentes”. Ainda nesse período, a estrutura será instalada em outros dois locais, promovendo pontos de encontro em diferentes zonas da cidade.
Foto por Paulo Fernando Machado.
O Espaço Recombinante vem a reordenar diversas experiências poéticas da Sala Dobradiça, em âmbito curatorial e artístico, pois, como um ponto de convergência, integra as noções de espaço já articuladas em seus projetos. Para além de um local endereçado, a Sala Dobradiça apresenta-se em diferentes faces, sejam flexíveis e ansiosas, plurais e expansivas, com dimensões delineadas por seus integrantes e colaboradores. Em seu repertório, o grupo já concebeu alternativas de exposição que envolveram instalações imersivas, volumes portáteis e intervenções urbanas.
O atual projeto consiste principalmente em um formato contextual, suscetível à interferências, montável e itinerante. Tem arquitetura efêmera e modular (de ferro, tapume e cobertura plástica, com volume básico de 64m³), passível de ser instalada em áreas públicas ou privadas. Seu desenho foi concebido de modo a possibilitar versatilidade de montagem, adquirindo tanto o formato de um espaço expositivo convencional (chamado por artistas e especialistas de "cubo branco"), como também outras formas de diálogo com o contexto, em um jogo simultâneo do que pode ser apresentado dentro e fora.
Como a base de todos os propostas internas e externas é a adaptação/ajuste, haverão momentos para testar, improvisar e aprimorar o Espaço Recombinante. Uma organicidade prevista e também em constante exercício. Deste modo, o projeto instiga os próprios artistas a buscarem flexibilidade em suas produções, a encontrarem um resultado equilibrado e, eventualmente, a complementarem a estrutura – “DNA” de uma obra reconfigurado noutra.
Em consideração a tais aspectos, recombinar é um valor que guia o projeto como um todo: (a) pela convergência das experiências do grupo; (b) pela matriz estrutural suscetível a modificações físicas, internas e externas; (c) pelo seu caráter contextual e intervencionista; (d) pelas sugestões de compor novas experiências com artistas e público.
A exemplo das aproximações almejadas com o público, desde o mês de agosto está disponibilizado no blog da Sala Dobradiça (www.saladobradica.blogspot.com) um jogo de peças moventes, criado a partir dos elementos gráficos que dão forma à logotipia do projeto. A criação do logo interativo aponta, de maneira lúdica e participativa, o delineamento prático e estratégico a ser executado por meio da estrutura física.
Logotipo e, ao lado, recombinações espontâneas de internautas.
Outro ponto de diálogo está na disseminação de pequenas maquetes montáveis ao público interessado, sendo um signo de ocupação a qualquer lugar possível, desde que condicionado por alguma vontade de estar. Os visitantes podem, novamente, experimentar o conceito em torno da estrutura a partir do próprio gesto – neste caso, o de montar e de levar a miniatura à destinos diversos.
Com isso, recombinações do logo e registros fotográficos da maquete em diferentes situações foram produzidos e publicados espontaneamente nas redes sociais em que a Sala Dobradiça difunde suas ações e eventos. Em pouco tempo, os primeiros efeitos dessas estratégias de aproximação já configuram o projeto como um vetor ramificado em afluentes expansivos; tem alcance na proporção do desejo e na medida em que está em diálogo.
O Espaço Recombinante é (o novo) segmento de uma poética derivante, mantida pela Sala Dobradiça há três anos. Da proposta surgem e surgirão outros produtos, eventos e ações complementares, a fortalecer um fluxo de produção que tateia mecanismos proliferantes de criação, rede e vida. Tais derivações assinalam uma “sujeição à dobra”, presente em cada iniciativa do grupo. Esse formato é ansioso, suscita ajustes, aprimoramentos técnicos, adequações estéticas e contextuais. Detalhes que atribuem um caráter de objeto artístico e relacional ao Recombinante - o qual transborda a simples noção de estrutura comportadora.
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Desde o dia 24, o projeto potencializa seu fluxo de visitação: mudou de local (a estreia foi na gare) e iniciou sua ocupação da Praça Saldanha Marinho. Por oito dias, o público santa-mariense terá acesso à proposta curatorial Lo que Llegó, da galeria Planta Alta, composta por 23 artistas paraguaios e produzida nas medidas do Espaço Recombinante.
Em outubro, a rede de espaços independentes promovida pela 8ª Bienal do Mercosul ganhará novas tessituras com a vinda a Santa Maria das organizações culturais Batiscafo e Proyecto Circo, ambas de Havana, Cuba. Será um novo momento para afinarmos modos de produção artística, oriundos de localidades tão distantes entre si. Será, também, uma nova etapa de encontros, a itinerar por outros lados da cidade, em busca dos olhares e atitudes mais diversos.
Convidamos a todos para que façam parte desse novo processo. Que o realizemos juntos! O Espaço Recombinante sempre está à espera e permanece vivo enquanto se relaciona.